A polarização política no Brasil: reflexões sobre fenômenos psicológicos

José Maurício de Lima

Mestre em Filosofia pela UnB

20/05/2025 • Coluna ANPOF

No cenário político contemporâneo do Brasil, a polarização é um fenômeno amplamente discutido e profundamente enraizado. Para entender as raízes desse fenômeno complexo, é essencial analisar alguns dos principais fenômenos psicológicos que o alimentam: o viés de confirmação, a ilusão de profundidade explicativa, a bolha epistêmica e a câmara de eco. Esses elementos não apenas influenciam a maneira como os indivíduos formam suas opiniões, mas também moldam o ambiente informacional e social em que vivemos.

O viés de confirmação é um dos pilares da polarização. Ele descreve a tendência natural das pessoas em buscar, interpretar e lembrar informações de maneira que confirme suas crenças pré-existentes. Em debates políticos acalorados, por exemplo, indivíduos têm a tendência de pesquisar e privilegiar fontes que sustentem suas convicções, ignorando ou desvalorizando evidências que contradigam suas visões. Isso não apenas fortalece crenças pessoais, mas também dificulta a comunicação eficaz e o entendimento mútuo entre diferentes grupos ideológicos. A pesquisa psicológica mostra que o viés de confirmação pode levar a decisões subótimas e perpetuar estereótipos, pois reforça a visão de mundo limitada do indivíduo ao invés de expandi-la com novas perspectivas e informações contrastantes.

A ilusão de profundidade explicativa refere-se ao comportamento de pessoas que superestimam seu entendimento sobre assuntos complexos ou técnicos. Na política, por exemplo, indivíduos podem expressar opiniões firmes sobre políticas públicas complexas sem necessariamente compreender completamente os fatores econômicos, sociais ou históricos envolvidos. Essa ilusão de compreensão pode levar a decisões equivocadas e a uma falta de humildade intelectual para reconhecer a própria ignorância ou incerteza sobre um tema.

Os dois fenômenos seguintes – bolha epistêmica e câmara de eco – foram mencionados em um estudo publicado na revista Proceedings, da Academia Nacional de Ciências (“The spreading of misinformation online”, https://doi. org/10.1073/pnas.1517441113). O referido estudo examinou dados sobre temas discutidos em redes sociais entre 2010 e 2014.

A primeira, bolha epistêmica, é um fenômeno contemporâneo exacerbado pelas redes sociais e pelos algoritmos de recomendação de conteúdo. Ela ocorre quando indivíduos são expostos principalmente a informações que confirmam suas próprias crenças, enquanto são menos expostos a perspectivas divergentes. Em plataformas digitais, como redes sociais e motores de busca, algoritmos frequentemente personalizam o conteúdo com base no histórico de navegação do usuário, criando assim uma bolha onde opiniões são reforçadas repetidamente, contribuindo para a polarização e limitando a diversidade cognitiva.

A câmara de eco, por sua vez, amplifica ainda mais a polarização ao criar espaços virtuais onde opiniões e crenças são validadas e reforçadas dentro de grupos fechados. Em fóruns online, grupos de WhatsApp e redes sociais, indivíduos interagem predominantemente com aqueles que compartilham suas visões de mundo, resultando em um ciclo de validação mútua. Esse ambiente não apenas reforça a polarização, mas também pode ser um terreno fértil para a disseminação de desinformação e teorias da conspiração, pois não há contrapontos suficientes para contestar informações falsas.

Em um contexto tão polarizado como o atual no Brasil, compreender esses fenômenos psicológicos é crucial para promover um diálogo mais construtivo e uma sociedade mais coesa. Combater a polarização requer esforços conscientes para diversificar as fontes de informação, cultivar o pensamento crítico e incentivar o respeito pelas diferentes perspectivas. Ao reconhecer e mitigar os efeitos do viés de confirmação, da ilusão de profundidade explicativa, das bolhas epistêmicas e das câmaras de eco, podemos trabalhar para um ambiente político e social mais inclusivo e informado, onde o debate saudável e a compreensão mútua possam florescer.


A Coluna Anpof é um espaço democrático de expressão filosófica. Seus textos não representam necessariamente o posicionamento institucional.

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