A 'Morte de Deus', Multiculturalismo e Religião na Pós-Modernidade: Reflexões a partir de Nietzsche e Habermas | Especial XX Anpof

Francisco Sousa

Doutor em Filosofia pelas Universidades Federais da Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte; Pós-Doutor pela Universidade Federal da Paraíba

Hugo Brandão

Professor e Coordenador do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião do Instituto Federal de Alagoas.

12/08/2024 • Coluna ANPOF

É com imensa satisfação que convidamos todas e todos a participarem do nosso minicurso, no qual, objetivamos analisar as relações entre religião, fé e sociedade na pós-modernidade, considerando a "morte de Deus", o multiculturalismo e as perspectivas de Nietzsche e Habermas.

Se no mundo pré-moderno o indivíduo devia apenas se adaptar às tradições e costumes sociais guiados pela religião e pela ordem social pré-estabelecida, no mundo moderno, as tradições passam ser justificadas e defendidas publicamente devido ao universo plural e competitivo de valores em que nos encontramos. A partir da modernidade, o indivíduo passa a exercer um papel ativo na constituição de sua própria identidade; e, mesmo compartilhando de uma diversidade de valores, costumes e crenças, ele pode permanecer desvinculado de todos eles. As sociedades contemporâneas se caracterizam por uma coexistência de diversos estilos de vida e visões de mundo. Com o advento do processo de racionalização e secularização ocorre uma quebra do monopólio institucional da religião, passando a mesma a restringir a sua área de atuação. Na modernidade, ocorre um processo de constituição de esferas autônomas ou de subsistemas sociais (política, economia, direito, moralidade, ciência, arte) que se separam da religião, autonomizando-se ou constituindo-se em esferas especializadas. Desse modo, a religião perde o seu domínio e se torna apenas um subsistema social entre outros (SOUSA, 2018).

É neste contexto, no qual a religião é posta à prova, que Hugo Brandão (2015) reflete sobre uma das mais expressivas sentenças proferidas por um filósofo: "Deus está morto!". Esta foi uma marcante expressão da filosofia de Friedrich Nietzsche, em que ele constata que o fundamento do mundo Ocidental: Deus, estava perdendo a plausibilidade como fundamento último para a sociedade de sua época, sobretudo, por conta do avanço da tecnologia e da ciência. Contudo, o referido autor, não se limita a analisar este discurso de Nietzsche de forma isolada, ao contrário, ele investiga quais os impactos e influências, de tal discurso, para o cenário religioso na pós-modernidade, debruçando-se sobre a seguinte problemática: Deus está morto?! A "morte de Deus" é um recorte da filosofia de Nietzsche e parte de sua vasta crítica a cultura de sua época, isto é, crítica a uma cultura alicerçada sob o ideário Cristão. Hugo Brandão analisa a crítica de Nietzsche ao Cristianismo, porém, desvenda um Nietzsche muito mais crítico ao Cristianismo que se seguiu, após a morte de Jesus, do que ao próprio Jesus e seus ensinamentos. A partir da leitura de autores que discorrem sobre a pós-modernidade, como Bauman, e de autores que enxergam a Religião de forma positiva, como Berger, Eliade, Crespi, dentre outros, Hugo Brandão, reflete acerca do fenômeno religioso na pós-modernidade e constata que a religiosidade continua com força vital impressionante. Mesmo a Religião institucional tem se reinventado e se reinterpretado, conseguindo ser autônoma diante das outras instituições, continuando a influenciar na sociedade, ainda que de forma mais tímida. A Religião tem se ressignificado, buscando se adaptar ao cenário pós-moderno e tem encontrado seu espaço e mantido sua importância. A ideia de Deus persistiu junto com a Religião e/ou religiosidade, no entanto, uma ideia de Deus ressignificada e com características muito mais pessoais e individualizadas, do que coletiva e absolutizada. Tais características da Religião e/ou religiosidade, na contemporaneidade, é, em grande parte, profundamente marcada pela "morte de Deus", mesmo que de forma inconsciente, dando suporte teórico para que o autor possa compreender melhor a relação dos indivíduos com a Religião atualmente e, sobretudo, propondo resposta para o seguinte questionamento e/ou afirmação: Deus está morto?!

Teremos discussão sobre os temas abordados no curso com troca de experiências e diferentes perspectivas, sendo um debate orientado pela temática do curso em questão e aprofundando os temas discutidos nas exposições dos professores que ministraram as aulas do curso. As aulas expositivas trataram em levantar problemas filosóficos que agucem e provoquem o debate filosófico.

Aula expositiva com recursos audiovisuais, nas quais exploraremos os complexos intercâmbios entre a transformação da religião na Modernidade e sua ressignificação na pós-modernidade, tendo como base as reflexões de Friedrich Nietzsche e Jürgen Habermas.

A partir do estudo das mudanças sociais e culturais que marcaram o período moderno, discutiremos como a religião passou de um papel central para uma posição de subsistema social, em meio a uma multiplicidade de esferas independentes. Analisaremos também a crítica de Nietzsche à cultura ocidental, destacando sua famosa sentença "Deus está morto" e suas implicações para o cenário religioso na pós-modernidade. Além disso, examinaremos a abordagem de Habermas sobre a religião na esfera pública, considerando sua defesa da inclusão das perspectivas religiosas no debate democrático multicultural. Será também abordada a ressignificação da ideia de Deus e a manutenção da religiosidade na contemporaneidade, mesmo em um contexto de pluralidade de crença e valores.

Debates em grupo, por fim, a aula promoverá um debate entre os participantes, permitindo a troca de ideias e a reflexão sobre as questões levantadas ao longo da discussão. Os alunos serão encorajados a expressar suas opiniões e a explorar diferentes perspectivas sobre o tema, contribuindo para uma compreensão mais ampla e crítica das relações entre religião, multiculturalismo e pós-modernidade. Contaremos, também, com análise de textos, os quais serão sugeridos leitura prévia e que leremos fragmentos durante o decorrer do curso.


Bibliografia Básica

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

BRANDÃO, Hugo. DEUS ESTÁ MORTO?!: A recepção da crítica de Nietzsche à Religião Cristã no cenário religioso pós-moderno. Recife: Fasa, 2015.

HABERMAS, Jürgen; TAYLOR, Charles. Multiculturalismo. Lotte per il riconoscimento. Milano: Feltrinelli, 1998b.

NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

SOUSA, Francisco Pereira. Multiculturalismo e Religião em tempos de Globalização. Goiânia: Phillos, 2018.

VATTIMO, Gianni. O fim da Modernidade. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

VATTIMO, Gianni. Depois da cristandade. São Paulo: Record, 2004.


O minicurso "A 'Morte de Deus', Multiculturalismo e Religião na Pós-Modernidade: Reflexões a partir de Nietzsche e Habermas" será ministrado por Francisco Sousa, doutor pela UFPB, e Hugo Brandão, professor e coordenador do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião do IFAL, integrando a programação do GT Ética e Cidadania, no XX Encontro Anpof, em Recife/PE. As inscrições estarão abertas às pessoas já inscritas no evento a partir do dia 15 de agosto.