Associação Brasileira de Ensino de Filosofia: breve histórico dos primeiros passos

01/08/2023 • Coluna ANPOF

Associação Brasileira de Ensino de Filosofia: breve histórico dos primeiros passos

À pergunta que orienta as comemorações das quatro décadas de existência da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia, a saber, Qual ANPOF queremos para os próximos 40 anos?, muitas são as possíveis respostas. Dentre estas, sem dúvida, está a de uma ANPOF que seja representativa de toda a comunidade filosófica: uma associação que tenha em seu escopo não apenas as demandas dos programas de pós-graduação em filosofia, como rege seu atual estatuto, mas, igualmente – e como paulatinamente vem ocorrendo – as especificidades da filosofia e do filosofar na educação básica e nos cursos de formação docente.

Não obstante nosso anseio por uma ANPOF com a tal abrangência, sabemos que a promoção da pós-graduação na área e a defesa desta última junto aos órgãos competentes, por si só, compõem uma pauta suficientemente extensa; ademais, são diversas e diversificadas as demandas da Filosofia nas escolas e nos cursos de graduação – exigências que envolvem a discussão de planos de ensino, metodologias, livros e recursos didáticos, passam pela militância política em defesa da obrigatoriedade do componente na matriz curricular dos ensinos fundamental e médio e abrangem debates sobre projetos pedagógicos de curso, estágio supervisionado e programas de formação docente (como o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência e o Residência Pedagógica); incluem, por fim, a própria consolidação do Ensino de Filosofia como uma subárea de pesquisa filosófica. Nesse sentido, e dada a urgência de algumas das pautas específicas da filosofia na educação básica, a própria ANPOF – na gestão 2021-2022 – fomentou a criação de uma associação parceira, uma entidade que pudesse levar a cabo o projeto de oferecer uma efetiva representação de agentes e ações relacionados ao Ensino de Filosofia, antecipando-se, inclusive, às políticas educacionais das quais costuma ser refém.

Uma nota sobre a semente de criação da nova associação nacional em questão foi divulgada no canal de notícias da ANPOF logo após sua proposição*. Nesta nota, anunciava-se que a mesa “Experiências de (r)existência”, parte constituinte da programação do V Encontro ANPOF Educação Básica, resultou em um convite do coordenador geral do evento, prof. Christian Lindberg e da então secretária geral da ANPOF, Patrícia Velasco, aos participantes do simpósio que debateu iniciativas de resistência aos ataques que a filosofia nas escolas vem sofrendo desde as políticas educacionais implementadas na esteira do golpe político de 2016. Criava-se, assim, o grupo de trabalho que assina (a fim de divulgar as atividades realizadas até o presente momento) a presente coluna, composto pelos professores Alex Sousa – Fórum de Professores(as) de Filosofia do Ceará, André Dornelles Pares – Movimento #FicaFilosofia, de Porto Alegre/RS, Francisco Valdério da Silva Jr – Fórum Maranhense em Defesa da Filosofia e Marcos da Silva e Silva – APROFFIB: Associação dos/as Professores/as de Filosofia e Filósofos/as do Brasil**.

A primeira reunião do grupo gestado no V Encontro ANPOF Educação Básica ocorreu em 20 de outubro de 2022 e, neste encontro virtual, os/as participantes discutiram um possível cronograma de trabalho e a necessidade de estudo dos estatutos de associações de natureza próxima. Neste intuito, foi convidada para a reunião do dia 17 de novembro a professora Maria Lima (UFMS) – vice-presidenta da Associação Brasileira de Ensino de História (ABEH) para o biênio 2022-2023 e coordenadora da Campanha Nacional em Defesa das Ciências Humanas na Educação Básica (CNDCH) – para o compartilhamento da experiência de trabalho na ABEH, pois o conhecimento de outras práticas seria importante para identificarmos os diversos pontos que a futura associação deveria considerar.

No âmbito da CNDCH, aliás, o grupo recém-reunido – em parceria com o GT Filosofar e Ensinar a Filosofar – foi convidado a elaborar um relatório diagnóstico da área de Filosofia para ser apresentado e entregue ao Grupo Técnico de Educação do Gabinete de Transição Governamental (coordenado pelo José Henrique Paim Fernandes), no início de dezembro. Em um primeiro exercício de produção coletiva, foi elaborado um documento em que – a partir de um diagnóstico do cenário de implementação da BNCC e do intitulado Novo Ensino Médio, assim como dos cortes orçamentários que atingiram da educação básica à pós-graduação – foram pontuadas problematizações e pautas para o governo Lula***.

Neste ínterim, ao grupo foram se somando representações de outras associações, notadamente, da Associação de Professores/as de Filosofia e Filósofos/as do Estado de SP (APROFFESP), da Sociedade de Estudos e Atividades Filosóficos (SEAF), além da professora Taís Pereira, representante da diretoria da ANPOF para o biênio 2023-2024 e representante da ANPOF no Comitê Diretivo da CNDCH. Deliberou-se também sobre a necessidade e pertinência de ampliação do número de participantes do grupo, incluindo colegas representantes dos institutos federais e dos dois mestrados profissionais em filosofia: PPFEN e PROF-FILO. Decidiu-se, porém, finalizar a etapa inicial de definição dos objetivos e finalidades da futura associação antes da almejada abertura – encerrando o primeiro ciclo de discussões com uma proposta a ser compartilhada com os pares. A ideia basilar de todo o trabalho, deve-se ressaltar, é a submissão de uma primeira proposta de estatuto a uma assembleia docente tão grande quanto possível, de forma que o documento inicial possa ser coletivamente discutido, aprimorado e deliberado.

No fim de abril de 2023, o grupo discutiu e aprovou o texto com as definições supramencionadas, aqui reproduzido.

Art. 1º São objetivos e finalidades da Associação Brasileira de Ensino de Filosofia:

I – Congregar profissionais com formação em Filosofia que atuem no magistério na área e/ou pesquisem Ensino de Filosofia em todas as suas perspectivas e em todos os níveis: educação básica, graduação e pós-graduação;

II – Reunir e publicizar iniciativas, práticas, projetos, pesquisas e produções em/sobre Ensino de Filosofia;

III – Fomentar o intercâmbio de ações e produções de ensino, pesquisa e extensão sobre Ensino de Filosofia realizadas nos diferentes níveis de ensino, estreitando a distância entre o que é realizado e produzido nas escolas e nas universidades;

IV – Defender a presença da Filosofia como disciplina obrigatória nos Ensinos Fundamental e Médio;

V – Combater ações e políticas públicas que orientem licenciadas e licenciados em Filosofia à docência em outras áreas do conhecimento na Educação Básica, assim como aquelas que orientem à docência em Filosofia por profissionais sem formação na área;

VI – Contribuir com os debates relativos à elaboração, implementação, execução e avaliação de políticas públicas para todos os níveis de ensino na área de Filosofia;

VII – Apoiar eventos, fóruns de debates e demais ações que se dediquem às atividades de ensino, pesquisa e extensão relacionados direta ou indiretamente ao Ensino de Filosofia;

VIII – Apoiar e atuar em atividades de formação docente no campo do Ensino de Filosofia;

IX – Apoiar e fomentar a pesquisa em/sobre Ensino de Filosofia em suas diferentes temáticas, perspectivas e fundamentações teóricas e práticas;

X – Apoiar e fomentar veículos e ações de divulgação filosófica;

XI – Preservar e promover o levantamento, a organização e o acesso à história e à memória do Ensino de Filosofia no Brasil;

XII – Defender a Filosofia do Ensino de Filosofia como campo de conhecimento e subárea de pesquisa junto aos cursos graduação, aos programas de pós-graduação e às agências de fomento à pesquisa e à formação de recursos humanos para a pesquisa no país;

XIII – Promover o diálogo entre a subárea de Ensino de Filosofia e as áreas de Filosofia, Educação e Ensino, estimulando a participação de seus associados e associadas em diferentes fóruns, associações científicas e eventos das áreas em questão;

XIV – Manter intercâmbio e colaboração com associações congêneres, sociedades científicas e fóruns dedicados às áreas de Filosofia, Educação e Ensino e, de modo mais sistemático/orgânico, com as entidades regionais concernentes ao Ensino de Filosofia;

XV – Manifestar-se quanto aos usos públicos e sociais relacionados ao Ensino de Filosofia;

XVI – Zelar pelos interesses comuns de seus associados e associadas no que concerne às atividades de Ensino de Filosofia em suas variadas dimensões;

XVII – Apoiar e colaborar com o desenvolvimento da educação pública de qualidade, pautada em valores democráticos, republicanos e laicos.

 

Com a proposta em mãos, no dia 29 de maio do corrente ano o grupo foi recebido pelo presidente da ANPOF, Érico Andrade, e os professores e professoras Adriana Delbó, Eduardo Vicentini, Ester Heuser, Francisca Gaileia e Georgia Amitrano, integrantes da diretoria (2023-2024). Na conversa virtual, a ANPOF reiterou o compromisso de parceria com a futura associação, bem como o de fazer a mediação entre a comissão e representantes dos Institutos Federais, do PPFEN e do PROF-FILO.

O trabalho da comissão se dirige para o momento de debate com a multiplicidade de sujeitos e instituições que fazem a Filosofia no Brasil, pois a legitimidade da futura instituição está atrelada à ampla participação de todos/as em todas as regiões do país. A colaboração que transpassou, desde o início, a produção de tal proposta, é a mesma que estará presente nos momentos de diálogo e refinamento da referida proposta de objetivos e finalidades da futura associação, que poderá ter no IV Encontro Nacional PROF-FILO o primeiro grande momento, pois membros da comissão estarão na mesa de encerramento do evento, marcada para o 25/08/2023 e com título “Possibilidades de uma Sociedade/Associação Brasileira de Ensino de Filosofia”. Por ser híbrido, todos/as os/as interessados/as poderão acompanhar a transmissão pelo Youtube do PROF-FILO****.

Das possíveis respostas à pergunta Qual ANPOF queremos para os próximos 40 anos?, uma seria a que queremos uma ANPOF fortalecida pela presença obrigatória da Filosofia nos ensinos fundamental e médio – fato que sustenta a existência da maioria dos cursos de graduação em Filosofia no Brasil, tendo na futura associação uma fiel irmã solidária, parceira e corajosa, que respeite a multiplicidade dos modos de se ensinar Filosofia no Brasil e seja um couraça de proteção aos seus membros.

Alex Sousa – Fórum de Professores(as) de Filosofia do Ceará

André Pares – Movimento #FicaFilosofia e vice-presidente da Associação des Licenciades em Filosofia (A.L.F.)

Christian Lindberg – Coordenador do V Encontro ANPOF Educação Básica

Francisco Greter – Presidente da Associação de Professores/as de Filosofia e Filósofos/as do Estado de SP (APROFFESP)

Francisco Valdério – Fórum Maranhense em Defesa da Filosofia

Jacira Souza – Presidenta da Sociedade de Estudos e Atividades Filosóficos (SEAF)

Patrícia Velasco – Coordenadora do GT da ANPOF Filosofar e Ensinar a Filosofar

Taís Pereira – Conselheira fiscal da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (ANPOF) e representante da ANPOF no Comitê Diretivo da CNDCH

 

* Disponível em: https://anpof.org/comunicacoes/noticias-anpof/semente-de-futura-associacao-de-professorases-e-plantada-durante-o-v-encontro-da-anpof-educacao-basica. Acesso: 18 jul. 2023.

** Em carta enviada ao grupo no dia 10/04/23, a APROFFIB notificou que, em reunião realizada no dia 31 de março, deliberou por não mais fazer parte da construção da nova associação.

*** Cf. Arquivo 14. Relatório Diagnóstico da Filosofia_GT-CNDCH 2022. Disponível em: https://anpof.org.br/gt/gt-filosofar-e-ensinar-a-filosofar. Acesso: 18 jul. 2023.

**** Link do Canal do Youtube do PROF-FILO https://www.youtube.com/c/proffilomestradoprofissionalemfilosofia