Homenagem do GT de Deleuze & Guattari a Roberto Machado
Mariana de Toledo Barbosa
Professora de Filosofia da UFF
08/07/2021 • Coluna ANPOF
Algumas semanas após o falecimento de Roberto Machado, nós, do GT Deleuze & Guattari, prestamos nossa homenagem a este que foi um dos pioneiros dos estudos deleuzianos no Brasil. Seu livro, “Deleuze e a filosofia”(1990), posteriormente expandido e renomeado “Deleuze, a arte e a filosofia” (2009), é uma grande referência e segue contribuindo para o nosso campo - como aliás aconteceu com diversos de seus escritos, dedicados a outros autores. Do mesmo modo, suas conferências, muitas felizmente registradas e disponíveis na rede, lançam luzes generosas sobre conceitos e questões frequentemente difíceis, como presentes que ele nos distribuía depois de um longo esforço de compreensão, e convidam a muitas e muitos que as assistem a explorar mais demoradamente os textosde Deleuze e Guattari.
Roberto Machado teve a oportunidade de frequentar cursos de Deleuze e de desenvolver uma pesquisa sob a sua supervisão, que deu origem ao seu livro, cujos fios condutores são o procedimento filosófico de Deleuze e a grande questão por ele formulada: o que significa pensar? Com seu entusiasmo, encarnava essa questão e provocava seu público a tentar pensar por conta própria, libertando-se de qualquer opressão advinda das exigências da história da filosofia. Inspirado por Deleuze, embora nem sempre em concordância com as interpretações do filósofo francês, considerava que a história da filosofia deveria estar a serviço do pensamento de cada um (a) de nós.
Sua sala de aula, abarrotada de gente espalhada pelas carteiras e pelo chão, lembrava as poucas filmagens a que temos acesso dos cursos de Deleuze na Paris 8, assim como a audiência variada, em que artistas por vezes renomados se misturavam anonimamente a universitários que se dirigiam ao Largo São Francisco, mesmo que estudassem ou lecionassem em outras instituições. Seus livros, cursos, palestras eram cuidadosamente preparados, pois, também como Deleuze, Roberto acreditava na repetição e no ensaio para inspirar-se e inspirar aquelas e aqueles que entravam em contato com ele. Um professor de filosofia, um filósofo, alguém que formou gerações e buscou afetar e ser afetado em seus encontros, Roberto trazia em seu corpo, nos longos gestos de suas mãos, em seu sotaque pernambucano marcado e largo sorriso, toda a vida que perpassa a filosofia,uma vida que nenhuma morte pode abreviar. Antes de partir, nos deixou mais um presente: seu livro sobre Proust, a ser publicado em 2022, no qual poderemos ler sua última grande conversa com Deleuze.