Notícia sobre guerra e desenvolvimento
Breno Augusto da Costa
Professor (IFPR) e doutorando em Filosofia (UFU)
13/11/2023 • Coluna ANPOF
A guerra, qualquer guerra, é processo de aumento do subdesenvolvimento. Onde quer que ocorra, travada entre dois ou mais oponentes que têm consciência plena dela ou não, e como quer que seja empreendida, é sempre um fenômeno de desenvolvimento do subdesenvolvimento. A mulher com medo, o idoso com fome, a criança ensanguentada, o hospital em ruínas e seus pacientes sob escombros: a guerra é o desabrochar macabro da degradação, da vulnerabilidade e da opressão.
Historicamente a guerra às drogas teve como alvo preferencial os negros e as outras pessoas de cor: nesse momento, e apenas nesse momento eles são prioridade incontestável. Eles são o alvo primeiro desta necropolítica que objetifica o usuário, que o desumaniza. Não estaríamos diante de pessoas livres e com poder de autodeterminação, senão de doentes ou criminosos.
A guerra híbrida se funda na deformação da consciência de coletividades. Só guerras híbridas em abstrato não culminam no empobrecimento da população, na derrocada dos suportes sociais que poderiam impedir ou se opor à espoliação econômica que faz funcionar esse movimento belicista. Ela é empregada a serviço do demiurgo belicista para garantir determinados acordos econômicos: resulta sempre na política de entrega da nação a interesses alheios.
A guerra de extermínio de um povo, guerra que se arrasta, segue a mesma máxima: ela é processo de aumento do subdesenvolvimento, de penúria das massas de uma nação, de degradação de suas condições materiais de existência.
A guerra assimétrica da civilização ocidental contra os palestinos teve inaugurado um novo capítulo. O leitor e a leitora atentos sabem que só poderão compreendê-lo conhecendo os anteriores, e ainda outros enredos da trama histórica da comunidade humana pluriversal, embora alguns deles sigam em plena redação: as lutas africanas por libertação, a fera soviética que não se deixa encurralar e a China almejando ser uma só China.
A retaliação ao terrorismo não deve se converter em genocídio, em destruição de vidas civis, em invasão seguida de muito provável ocupação de territórios e em diáspora forçada. Nesse capítulo mais recente, um dos regentes da orquestra da destruição clama até mesmo o nome de Deus ao ameaçar a prolongada – em sua série histórica mais ampla ela se prolonga há várias décadas – destruição de uma nação. Ele, que há poucos meses sofria desgaste pela pressão popular, pois seu próprio povo se opunha ao totalitarismo que esboçara, clama por união. Fiel às vantagens que pode obter, o velhouco Sam apareceu rapidamente para mostrar seu incondicional apoio. Na realidade trata-se de um apoio mútuo: um produz e lucra com a venda armas, o outro produz e tira vantagens da destruição de seu entorno. Existe uma contradição dialética entre os interesses econômicos do cinturão do Sol e a paz mundial.
Em outra parte do globo, a parte que é nossa, embora sob ameaça constante das garras de outrem, do Ocidente, a consciência ingênua se arvora em defender uma nação genocida a partir de símbolos e em completo esquecimento da referência à realidade concreta. Símbolos estes sagrados para uns, signos de morte para os Outros alhures.
Apesar das promessas e apesar da arrogância, esse capítulo que começou no dia sete de outubro, e que, fique claro, é mais um capítulo da história ampla do colonialismo versus os povos do Sul Global, pode nos surpreender com o raiar de um novo dia. Esta alvorada, porém, só pode irromper com os fulgores da ação decidida daqueles que constroem um mundo multipolar.
A Coluna Anpof é um espaço democrático de expressão filosófica. Seus textos não representam necessariamente o posicionamento institucional.