Carta de Susana de Castro - encerramento de mandato
Susana de Castro
Professora do Departamento de Filosofia e do Programa em Pós-Graduação em Filosofia da UFRJ; Integrante do GT Filosofia e Gênero da Anpof.
16/12/2022 • Notas e Comunicados
Nossa gestão termina seu mandato marcada pela situação atípica da pandemia da Covid 19. A enorme crise sanitária e humanitária pela qual o Brasil e o mundo passou deixa marcas profundas. Muitas vidas foram ceifadas e nossa comunidade filosófica perdeu muitos membros queridos. Durante esses dois anos atuamos fortemente nas redes sociais. Em nossa gestão, inauguramos a seção Resenhas Anpof, cujo objetivo é proporcionar à nossa comunidade um conhecimento sobre os livros recém-publicados. Publicamos 15 resenhas nesta seção, sendo que uma delas foi divulgada na Revista Humanitas, veículo com o qual mantemos parceria desde 2019. A nossa Coluna Anpof, espaço voltado à divulgação de pesquisas e que também busca dialogar com questões contemporâneas e contribuir para o debate público, recebeu mais de 50 textos em 2022. Alguns voltados especificamente para os temas trabalhados nos minicursos do nosso XIX Encontro Anpof e outros que foram divulgados no Le Monde Diplomatique Brasil, com o qual também temos parceria.
O nosso podcast produziu oito episódios em 2022: um voltado à nossa campanha do mês das mulheres na Anpof e outro ao nosso novembro negro. Os outros seis tematizaram os debates abordados nas mesas redondas do XIX Encontro Anpof. Também publicamos nove entrevistas em nosso site. Entre elas estão as entrevistas com os conferencistas do nosso XIX Encontro que também foram publicadas em outros veículos: com Françoise Vergés, na Revista Le Monde Diplomatique Brasil; Silvia Federici, no site do mesmo veículo; Ailton Krenak, na Carta Capital e Filomeno Lopes, na Revista Humanitas. O nosso canal no YouTube também se consolidou como uma importante ferramenta de debate e diálogo em nossa gestão. Fizemos uma roda de conversa no mês das mulheres e outras cinco ao longo do ano que discutiram livros recém-lançados de nossa área e que serviram ao debate das eleições. Tiramos dúvidas de editais e de inscrições, participamos da SBPC, debatemos as eleições da Anpof e ainda transmitimos todas as conferências de nosso XIX Encontro. Ainda neste ano, começamos a divulgar algumas das dezenas de comunicações gravadas neste encontro, tendo os trabalhos do GT de Filosofia e Raça abrindo essa sessão. Ainda divulgamos novo verbete da nossa enciclopédia audiovisual de Filosofia, “colorismos”, que também movimenta essa iniciativa que terá novos verbetes lançados nos próximos meses, gravados durante o nosso encontro. Produzimos essa diversidade de conteúdo a partir da colaboração de toda a nossa comunidade filosófica e demos visibilidade à produção do trabalho realizado em nossos programas de Norte a Sul do país, que refletem a pluralidade de nossa área. Importante destacar que nossos convites para esses espaços sempre estiveram orientados pela diversidade de gênero, cor e regionalidade.
Além de tudo isso, em junho de 2021, lançamos uma cartilha com orientações aos docentes e pesquisadores sobre assédio à pesquisa, liberdade acadêmica e liberdade de cátedra. O documento foi elaborado pela diretoria da Anpof, com a coolaboração de Edgar Lyra e Valéria Wilke. A cartilha esclarece o que são a liberdade cátedra, pensamento e a autonomia universitária e quais as diferenças entre eles. Também indica a responsabilidade das instituições, orienta como pesquisadores e docentes podem se proteger na era digital, esclarece quais são as garantias legais e aponta como produzir provas legais. Cabe também destacar nossa entrada na Federação Internacional de Filosofia (FISP) como membros permanentes e nossa atuação na Rede Iberoamericana de filosofia. Além disso, a Anpof, junto com a ABECS, ANPUH, ABEH e AGB, passou a integrar o Comitê Diretivo da Campanha Nacional em Defesa das Ciências Humanas no Currículo da Educação Básica, lançada no dia 30/10/2022. Entre outros objetivos, a campanha pretende pleitear a obrigatoriedade das disciplinas Filosofia, Sociologia, História e Geografia na Educação Básica.
A edição 2022 do Prêmio Anpof reafirmou a qualidade e a diversidade da produção filosófica nacional. Recebemos 34 inscrições de dissertações e 18 inscrições de teses, mobilizando 64 docentes, de 50 dos 52 PPGs filiados, na Comissão de Avaliação. A Anpof, participou, junto com a coordenação geral do PROF-FILO, e a Capes, para pleitear a expansão do Programa, uma promessa antiga e que ainda não havia sido atendida. A solicitação foi atendida, um edital foi criado e o Programa hoje é composto por 25 núcleos, suprindo demandas regionais e locais.
A Anpof também promoveu um debate com a coordenação da área e com as coordenações da pós-graduação de filosofia no sentido de compreender os vários imbróglios que se sucederam na CAPES durante o governo Bolsonaro. Esse encontro online foi uma oportunidade para a área entender um pouco as mudanças, e foram várias, na política da CAPES. Fizemos uma reunião com as coordenações de pós-graduação para discutir a consulta para a nova coordenação de área no sentido de escutar a comunidade quanto à postura que deveríamos assumir diante do prazo exíguo para a consulta junto a nossa área. Por fim, na Anpof fizemos reuniões híbridas tanto com a CAPES quanto com o CNPq para discutir as políticas de pesquisa e de avaliação da pós-graduação.
Durante os eventos relacionados à temática de gênero e filosofia durante o mês de março deste ano, a Anpof e o GT Filosofia e Gênero apresentaram a intenção de fazer um levantamento das produções de cada programa relativas à esta temática na última década, através do lançamento de um formulário para a coleta destes dados para a posterior realização de um relatório, a ser apresentado no encontro presencial da Anpof. Como não houve um retorno expressivo por parte da comunidade, a Anpof encomendou o relatório de dois sociólogos, Antônio Brasil Jr e Lucas Carvalho, especialistas na coleta e tratamento de dados através da Plataforma Lattes. Importantes levantamentos que ele traz: - a explosão dos estudos de gênero, iniciada em torno de 2013, conhece seu apogeu no ano de 2017 sob a forma de produção de artigos científicos, mais especificamente; - a proporção entre homens e mulheres na população de docentes dos programas é brutalmente desigual: dos 1.111 nomes levantados, 22% são "nomes femininos" e 78% são "nomes masculinos". Essa situação se agrava ao conferir-se a distribuição de bolsas de produtividade CNPq e projetos contendo termos referentes aos estudos de gênero, mostrando que as pesquisas nestes termos não estão recebendo este tipo de financiamento. Quanto aos pesquisadores e pesquisadoras Bolsistas de Produtividade, a proporção entre ambos é ainda mais desigual do que no conjunto da população, sugerindo que tal sistema parece estar reforçando a desigualdade de gênero, ao invés de mitigá-la e/ou corrigi-la.
Nossa diretoria, por fim, realizou com sucesso o XIX Encontro Nacional de Programas de Filosofia na cidade de Goiânia em outubro - veja o vídeo institucional do evento aqui. Tivemos 2000 inscritos de todos os estados e distrito federal, 53 Sessões Temáticas, 70 GTs. O encontro teve a participação virtual de Ailton Krenak, Silvia Federici e Françoise Vérges. Além disso contou com a presença do filósofo de Guiné Bissau Filomeno Lopes. Terminamos com a sensação de dever cumprido, mas também a de que poderíamos fazer mais. Afinal sempre se pode fazer mais. Por isso, desejamos que a próxima gestão, que se inicia agora em janeiro de 2023, aprofunde ainda mais as pautas de igualdade de gênero, regional e de raça. Boa sorte!
Desejamos a todos um feliz natal e um prospero ano novo, que possamos amanhecer em janeiro de 2023 com uma perspectiva de viver em um pais cada vez mais distante do fascismo e das desigualdades.
Susana de Castro, presidente da Anpof 2021-2022.