SEM FILOSOFIA NÃO TEM BASE - Carta do GT Filosofar e Ensinar a Filosofar sobre a BNCC
20/05/2021 • Notas e Comunicados
SEM FILOSOFIA NÃO TEM BASE
Os termos competência e habilidade não são novos no discurso educacional brasileiro. Desde a LDB (Lei 9394/1996) se fazem presentes e orientam as políticas educativas para a escola básica, como as Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio, DCNEM/1998; os Parâmetros Curriculares Nacionais, PCNEM/1999; as Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, OCNEM/2006, entre outros documentos.
É possível, também, dizer que desde meados do século XX as ideias da Escola Nova e as pedagogias ativas sustentaram críticas à denominada escola tradicional e anunciaram que não se tratava mais de ensinar, mas de fazer aprender a partir de situações-problema. A compreensão do professor como aquele que ensina conteúdos foi dividindo espaço com a do professor que desafia e coloca problemas a seus estudantes para que possam atuar de modo ativo na compreensão de processos, conceitos, fatos, etc.
A partir dos anos 1990 muitos países realizaram reformas nos currículos da escola básica com o objetivo de responder às críticas de oferecer uma formação precária e mantenedora de desigualdades sociais ou de não tornar os estudantes aptos a se colocarem no campo profissional. O Brasil, com a aprovação da LDB em 1996 fez com que o campo educacional se movimentasse, seja para fazer críticas a essa nova concepção de currículo e de ensino, seja para encontrar modos de gerar seu entendimento pela comunidade escolar, como também para realizar sua implementação.
Os PCNEM/1999 e mais tarde as OCNEM/2006 indicaram, de maneira explícita, os caminhos a serem seguidos para tal implementação. O currículo, organizado por áreas de conhecimento, manteve cada componente curricular com competências e habilidades específicas. Atualmente, com a aprovação da BNCC e da reforma do ensino médio, as áreas de conhecimento ganharam centralidade ao terem, cada uma delas, seu conjunto de competências e habilidades.
No que tange à Filosofia como uma disciplina escolar, interessa-nos pensar sobre as modificações que a BNCC gerará no rol de seus conteúdos e nos modos de ensiná-los. Dito de modo mais claro, será preciso pensar sobre o que caberá ao professor ensinar e como se ensina competências e habilidades que lhe são próprias, tendo como referência as dez (10) competências gerais e as competências e habilidades da área Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, na qual está inserida a FIlosofia.
Se num primeiro momento a terceira versão da BNCC causou perplexidade e desencanto por se perceber a diluição da Filosofia na área das Ciências Humanas e Sociais Aplicadas e a perda de sua especificidade, um olhar crítico lançado aos documentos mostra que é possível e necessário dar visibilidade aos elementos de Filosofia que ali permaneceram. Dito de outro modo, percebeu-se que era possível encontrar os conteúdos (conceitos, ideias, problemas) filosóficos no emaranhado de competências gerais e competências da área. A realização deste trabalho tem o sentido, pois, de fazer um outro movimento de pensamento acerca da pedagogia das competências, orientadora das atuais políticas para a educação básica brasileira, em especial, para o ensino médio, deslocando-se da denúncia e da crítica para a busca de possibilidades e de possíveis proposições a serem endereçadas aos professores e professoras que ensinam Filosofia no dia a dia da escola brasileira.
A denúncia e a crítica são fundamentais, e seria vexatório se a comunidade filosófica-educacional não se pronunciasse deste modo acerca das mudanças definidas pela BNCC e pela Reforma do Ensino Médio, que, entre outras coisas, enfraqueceu a presença da Filosofia como disciplina escolar. No entanto, entendemos que diante de sua implementação, era necessário um olhar crítico, com objetivo de pensar modos de operar nas escolas desde a BNCC e, especialmente, reconhecer no conjunto das referidas competências e habilidades os conteúdos, temas, conceitos, problemas próprios da disciplina, familiares a professores e professoras. É preciso considerar que não seria possível o desenvolvimento das competências gerais e certas competências específicas da BNCC sem a Filosofia.
Esta é, portanto, imprescindível para o desenvolvimento das competências da BNCC devido a sua especificidade e sua relevância na formação de sujeitos críticos e capazes de viver em comunidade. Considerando que a BNCC fomenta o diálogo entre as áreas do conhecimento, a capacidade de argumentação e elaboração de percursos formativos, estimulando uma atitude autônoma dos estudantes no processo do conhecimento, o estudo da Filosofia oferece os alicerces teóricos não apenas para as ciências humanas, mas também para as demais áreas. Além disso, estimula, pelo exercício da análise criteriosa de temas, a elaboração de teses e a investigação, o que é necessário para o avanço das ciências e para uma atuação efetiva na vida universitária. Desconsiderar a relevância das especificidades da disciplina é fragilizar os edifícios conceituais que sustentam as diversas áreas e reduzi-los a seus aspectos utilitários, o que, a longo prazo, inibe o desenvolvimento científico e tecnológico.
Por esses motivos, na tabela abaixo oferece-se uma análise acerca das competências gerais da Educação Básica e das competências específicas da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, conforme expressas na BNCC. Nosso objetivo foi extrair conceitos, ideias e problemas específicos da Filosofia contidos nas próprias competências, de modo a oferecer subsídios para professores e professoras envolvidos com a implementação da reforma do ensino médio e para a defesa da presença efetiva da nossa disciplina nas escolas.
Núcleo de Estudos da Educação Básica do GT Filosofar e Ensinar a Filosofar - ANPOF