O Eu Impertinente: romantismo, eu agonal e filme de gângster
Inquietude, v. 3, n. 2 (2012) • Revista Inquietude - Revista dos Estudantes de Filosofia da UFG
Autor: Carla Milani Damião; Talita Trizoli; Edson Lenine G. Prado; Jadson Teles Silva; Joyce Neves de Campos
Resumo:
“O retorno do trágico na modernidade” é o subtítulo da segunda divisão do livro de Josef Früchtl, intitulado O eu impertinente. Uma história heroica da modernidade.
A elaboração deste artigo conjunto tem por base a continuidade de um plano editorial do Grupo Kinosophia junto a Revista Inquietude, articulada a um conjunto de aulas do Prof. Früchtl, ministradas em agosto de 2011 na Faculdade de Filosofia da UFG. Sua teoria sobre filosofia do cinema contribuiu para a formação do Grupo de Estudos Kinosophia, ao promover a discussão de suas ideias no exercício de tradução de suas aulas e textos, bem como da revisão da filmografia por ele indicada. Os artigos são, portanto, resultados desta experiência contada em três etapas: 1. Modernidade, subjetividade, Hegel e o Western; 2. O romantismo, o agonístico e o filme de gângster; 3. O hibridismo, Nietzsche e a ficção científica.
A divisão tripartide da subjetividade relacionada às representações artísticas ou aos gêneros de filmes, revela, na estrutura de sua teoria, uma auspiciosa ligação entre a teoria estética hegeliana e as teorias damodernidade. A permanência impertinente da subjetividade, refletida em sua dilaceração nos gêneros de filme ora investigados – o Western e o filme de gângster – permite ao autor superar limites de uma discussão infinitamente viciosa sobre a distinção entre modernidade e pós-modernidade. Assim, pode-se somar a esta questão a representação estética como representação não exatamente da totalidade de uma cultura e época, mas a representação projetada na interpretação de uma subjetividade não mais composta, um novo tipo de representação de subjetividade permeada pela ironia e pelo princípio que o autor chama de princípio agonal.
Apresentaremos as ideias centrais dos capítulos que compõem a segunda parte desta obra, relativas à questão da subjetividade no romantismo nascente na Alemanha e suas repercursões teóricas na contemporaneidade, bem como as associações realizadas entre estas e os gêneros fílmicos, entre os quais se destaca o gênero filme de gânster, precedido por uma passagem do gênero do Western a este. Na passagem de um gênero a outro, encontramos aproximações e diferenças. A transição se faz entre a imensidão inóspita do Oeste selvagem, os lugares de fronteira que marcam as construções das pequenas cidades, até a ambientação no centro urbano de uma sociedade capitalista estruturada. O filme de gângster remete, portanto, à incorporação do urbano moderno, à sedimentação do capitalismo moderno, adquirindo uma característica empreendedora que se reflete na inquietude e ambição desmedida do herói neste gênero. A maior semelhança entre os gêneros do Western e do filme de gângsters são os homens armados. A maior diferença é a maneira como as armas são utilizadas. Há um caráter documental em ambos os gêneros, sendo o criminoso Al Capone, o exemplo histórico para a criação de personagens gângsteres como Scarface. A figura egocêntrica, empreendedora, que ascende na sociedade por meio da crueldade e do gozo experimentado por meio desta, termina por representar o outro lado da moeda do American dream, deste lado afirmativo do sucesso guiado pela ideia de felicidade material. O elemento trágico é visível neste contexto de um enriquecimento rápido e inescrupuloso. A sina do gângster é conhecida desde o início. A solidão do gânster – muito diferente da solidão do cowboy que aceita estoicamente vagar pela imensidão da planície – é tal como a do tirano, é o prenúncio de sua morte. O gângster é uma criação do imaginário do cinema americano; no mundo real dos grandes centros urbanos, ele não existe; existem criminosos. O glamour associado à inquietação, a um querer desmedido sem limite, calculista, que inclui o prazer da crueldade, o convívio com homens vaidosos que se julgam infinitamente poderosos, sempre acompanhados por belas e infelizes mulheres, a morte anunciada desde o início da realização de suas ambições, é uma invenção em larga escala no cinema, justificada pela inspiração de criminosos que a sociedade real mantém sob vigilância.
Este artigo tratará incialmente da definição do princípio que move este personagem, nomeado por Früchtl como princípio agonal, elaborado com base na reconceituação do trágico. As teorias filosóficas que fundamentam este princípio remetem ao Idealismo Alemão e Romantismo, teorias que ecoam, como referência, a discussão de Früchtl com Charles Taylor e Richard Rorty. Trataremos em um segundo momento da reformulação do herói trágico operada na passagem do cowboy solitário para o gângster da cidade, incluindo nesta parte algumas citações relativas aos seguintes filmes: Unforgiven (Os imperdoáveis), The wild bunch (Meu ódio será sua herança), High Noon (Matar ou morrer), Scarface e The Godfather I (O Poderoso Chefão I). A construção da figura do herói na passagem de um gênero a outro, remete a uma ideia retirada da teoria de Walter Benjamin em dois momentos: a apropriação da idéia do herói como ator ou intérprete e a ideia de melancolia. Por fim, a composição desta figura completa-se com a definição do que poderíamos chamar de caráter “Cool” ou “Blasé”, constituído em aliança com o irônico. Os filmes de referência neste caso, além dos já citados, são: Silêncio dos inocentes, Pulp Fiction, Bonnie & Clyde.
ISSN: 2177-4838
Texto Completo: https://drive.google.com/file/d/0B4AeuuKw4oJndkNyRHBGRW1peHc/view
Revista Inquietude - Revista dos Estudantes de Filosofia da UFG
Indexada na QUALIS como B4, a Inquietude é a revista científica (ISSN 2177-4838) dos estudantes de graduação e pós-graduação em Filosofia da Universidade Federal de Goiás. Trata-se de um periódico acadêmico semestral que publica textos filosóficos inéditos: artigos, traduções, resenhas e entrevistas.