Hempel, Semmelweis e a verdadeira tragédia da febre puerperal
Vol. 5, No. 1 • Scientiae Studia
Autor: Marcos Barbosa de Oliveira; Brena Paula Magno Fernandez
Resumo:
Em seu manual introdutório Filosofia da ciência natural, Hempel apresenta, enquanto ilustração e ponto de partida para uma análise do processo de invenção e teste de teorias científicas, um relato do caso Semmelweis – o médico húngaro que, em meados do século xix, em Viena, descobriu a causa da febre puerperal e um método eficaz de prevenção. O relato, se por um lado não incorre em inverdades factuais, por outro, é bastante sucinto, omitindo uma série de aspectos importantes do caso. A tese deste artigo é a de que, embora tais omissões se justifiquem plenamente em função dos objetivos do relato, elas são também convenientes para Hempel, na medida em que ajudam a transmitir uma imagem da ciência que vai muito além dos processos de invenção e teste de teorias, que reflete a concepção positivista de ciência – e assim, quaisquer que tenham sido a intenções do autor, contribuiu para sua disseminação e fortalecimento. Uma imagem que, pelo menos neste caso, não corresponde à realidade. Para demonstrar a tese, expomos as partes da história de Semmelweis omitidas por Hempel e mostramos como elas não se coadunam com a imagem positivista da ciência. Ao longo desse percurso, distinguimos três tipos de crítica à historiografia positivista: a kuhniana, a pós-moderna e a engajada. Na conclusão, tecemos algumas considerações sobre a pesquisa médica nos dias de hoje.
Abstract:
In his introductory textbook, Philosophy of natural science, Hempel presents, as an illustration and a starting point for an analysis of the processes of inventing and testing scientific theories, an account of the researches of Semmelweis the Hungarian physician who, in the middle of the xixth century, discovered the cause of puerperal fever and an effective method of prevention. The account does not involve anything that is factually untrue, but it is quite succinct, leaving out many important aspects of the case. Our thesis is that, although those omissions are justified in view of the aims of the account, they are also convenient to Hempel, because they help to propagate an image of science which goes much beyond the processes of invention and test. It is an image which reflects the positivist conception of science, and thus, whatever the intentions of the author, contributes to the dissemination and strengthening of that conception, but which, at least in this case, does not correspond to reality. To demonstrate the thesis, we give an account of the parts of Semmelweis's story omitted by Hempel, and we show how they do not fit in with the positivist image of science. Along the way, we distinguish three types of critique of positivist historiography: the Kuhnian, the post-modern, and the engagé. In the conclusion, we present some considerations concerning the medical research of today.
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1678-3166200700010000
Texto Completo: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-31662007000100004&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
Palavras-Chave: Hempel,Semmelweis,Puerperal fever,Kuhn,Latour
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